"O amor é o ridículo da vida. A gente procura nele uma pureza impossível, uma pureza que está sempre se pondo. A vida veio e me levou com ela. Sorte é se abandonar e aceitar essa vaga ideia de paraiso que nos persegue, bonita e breve, como borboletas que só vivem 24 horas. Morrer não doi."


Cazuza

domingo, 19 de julho de 2009

Quase uma eternidade de nada

De olhos vendados, preso na cadeira

podia ouvir os barulho do silêncio.

Na mente, tudo escuro

em volta, paredes sem portas e janelas.


Tudo branco.


Com muito esforço em vão, a voz me falhava

As mãos atadas.


Abandono.


Faziam dias, meses, anos..

Por quanto tempo estive lá?

Por quanto tempo estaria?


Sozinho.

Mas alguém observava.


Medo.


Ele estava sempre lá? Por quê?

Por que não ia embora?


Coragem.


Quando minhas mãos se soltaram 

meus olhos podiam ver o branco desaparecer

e muitas cores me abraçavam. 

Havia música e alívio.

Uma linda música me contagiava e o embalo fazia esquecer a agonia

tudo dançava ao meu redor: mesas, cadeiras, armários.  

E cantavam uma melodia de prazer..


Quando no alto, de súbito, podendo ver tudo de cima de uma nuvem no céu,

eu pulei e cai. Cai infinitas vezes..

Caindo.. Caindo.. e não parava de cair.

O frio congelante era de cortar a pele.

Por horas, horas caindo numa imensidão branca..


E nada.


Um nada absoluto que devorava o resto de lucidez que sobrara

Caindo numa velocidade desumana. 

Até mesmo o terror era frio.


Parado no nada..

Eu corria, corria rápido, cada vez mais depressa.

Seria a mais asquerosa companhia pior do que a do nada?


Vazio.


Nem um grão de nada. 

Nem uma parede para se encostar, nada.

Horas a fio, esperando nada acontecer.

Um torpor, um cansaço.


De repente a luz branca que antes cegava se afastara

E uma mão delicada que me levaria ao desconhecido aparecia

Limpava meu rosto, minhas feridas.

Me acalmava o amor.

Era tudo lindo, e a música nostálgica voltava a tocar


Dancei.


Estaria eu livre?

Era bom, era muito bom.


Quando de trás para frente a música começou a tocar

revelando mensagens ocultas, subliminares apareciam

vozes que chamavam, zumbidos que atormentavam..

A mão delicada apodrecia e caia como pó

e deixava ser levada pelo vento.


Quando acordei.

Ainda sentado, vendado e atado no mesmo lugar.


Baseado em A mancha de Luis Fernando Veríssimo, onde relata histórias da ditadura militar.

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